Quantas
vezes gritei a danada da frase na infância. Era no ônibus, nas calçadas cheias.
Era gritar e rir junto com a criançada. Não, eu não era louco, se fosse
gritaria sozinho e levaria, na certa, um cascudo de um adulto mal humorado! Na
minha infância era assim! Cascudo doía, mas não matava ninguém!
-
Aiiiiiiiiii! Uma cobra! – Gritava a desprevenida menina!
Lá
estava eu puxando a linha com um capim navalha na ponta nas sombras mais
escuras do anoitecer. Era rir e correr – para fugir de cascudo!
E
lá ia eu com nota amarrada, barbantinho cheiroso nas reuniões de adultos,
estalinhos ou bombinhas pela janela perto das moças, estourando sacos,
capturando sapos para soltá-los no cinema.
Naquela
época eu ficava acanhado diante da beleza das meninas da escola, sentia nojo de
saliva quando pensava em beijar na boca e levava muitos cascudos.
Hoje,
vi minhas filhas presas pelo computador, pela TV, pelos rituais da vaidade e saindo
apenas para balançar a bunda uma ou duas noites por semana. E me preocupo com a
violência quando elas saem.
As
bicicletas ficaram guardadas e enferrujaram para não serem roubadas quando elas
estivessem passeando na rua. O carro tem filme para esconder os passageiros e
seguros ao preço de uma moto.
O
mundo mudou, ficou mais veloz e mais violento. Aqui, onde temos paz, morrem
mais jovens do que nas guerras do outro lado do mundo. As teclas nos aproximam,
nos contam os fatos e a notícias – nem sempre verdadeiras – e também aplicam
golpes financeiros e atraem inocentes para armadilhas sexuais, financeiras,
sequestros e até escravidão.
O
homem moderno continua usando mão de obra escrava – disfarçada ou não. O saber
é exigido mas não é fornecido pela mesma sociedade que o valoriza. Os homens,
que deviam ser os mais sérios, mentem, se corrompem e se apropriam do que é
público – em especial no mundo político e empresarial.
Não
é tão notório, mas o homem público só consegue locupletar-se se do outro lado
existir um empresário ganancioso e egoísta. E estes empresários possuem
empresas de todos os níveis, portes, natureza e faturamento.
E
quem realmente confia na polícia. Quem orienta seus filhos, como meus pais me
orientaram, a procurar um policial se estiver perdido e desorientado? Minhas
filhas eram aconselhadas a procurar um comércio onde existisse uma funcionária
e apenas com ela se comunicar.
É
isso mesmo. Estou decepcionado é comigo mesmo, com você, com os seres humanos.
Na milenar cultura humana sempre prevaleceu o egoísmo patrimonial. Dominar o
mundo foi sonho dourado de muitas sociedades. Segregar e escravizar outros
povos eram troféus de guerra. Desrespeitar idosos e crianças e abusar das
mulheres dos inimigos sempre foi considerado – na guerra – como normal,
natural.
Mesmo
diante de cataclismos, enquanto alguns seres se propõem voluntariamente a
ajudar outros saqueiam e em meio aos voluntários estão muitos aproveitadores.
Esses somos nós. Não tem como fugir desta responsabilidade.
Mas
o que fazer?
Muito!
Muito mesmo!
A
sociedade não pode aceitar que crianças (até 21 anos) fiquem nas ruas sem
arrimo, sem acesso a educação e moradia. Se os pais não dão devem ser punidos e
o estado tem que dar – e o estado somos nós com nossos impostos e nossos votos.
A
sociedade também não pode aceitar que viciados fiquem à margem da sociedade
pois para adquirir as substâncias entorpecentes eles roubam e até matam –
acabam com a garantia ao patrimônio dos cidadãos e da sociedade – acabam com a
garantia do direito à vida. Eles devem encontrar apoio, abrigo e tratamento e
nós que pagamos impostos e votamos temos que garantir isso.
A
sociedade também não pode permitir a miséria. Enquanto houver um miserável
nossa sociedade estará sofrendo de enfermidade crônica. O remédio é a
distribuição de renda com ampla participação dos indivíduos da sociedade
policiando, fiscalizando e denunciando o abuso no uso doas ferramentas que
venham a promover um desenvolvimento sustentável dos miseráveis de nossa sociedade.
Para isso devem estar atentos ao uso dos seus impostos e dos seus votos.
Então
a utopia é possível e realizável se a nossa participação não for apenas
verbalizada. Transformemos a utopia da participação plena na queda do egoísmo
generalizado e incentivemos a participação de nossos pais, filhos, vizinhos,
colegas de trabalho, parentes, conhecidos e amigos.
Participem
das campanhas políticas das pessoas sérias. Se elas forem infectadas pelo vírus
do poder denunciem e além de apoiar alguém melhor lute pela queda do que se
corrompeu buscando ser superior a nós mesmos como a maioria dos políticos se
julgam.
Foi
essa a forma que encontrei de chamar a atenção de vocês, mais uma vez gritei:
-
A moça caiu!
Borges.RJ
Contador de Histórias
borges.rj@globo.com
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