sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Atrás das Grades


Estou preso! Minha vida é ficar aqui, atrás de grades, vendo o tempo passar por mim. E o que é pior, eu estou com medo.
Medo de bandidos, traficantes, assaltantes, motoqueiros, arma de brinquedo, batedor de carteiras e até de gangues infantis que gozam da proteção de um estatuto distorcido para elas.
Medo de soldados, peemes, policiais civis, rodoviários, bombeiros, carcereiros, milicianos, carros blindados ou caveirão como insistem em chamá-los, e até de ordenadores de trânsito ou mesmo equipe da Lei Seca.
Medo de ter minha casa roubada, ou pior, assaltada, medo de ter, pois tudo que se tem é alvo de bandidos. Medo de usar a internet, de ir ao banco ou à feira, fazer compras em Madureira e até de ir à praia.
Medo de denunciar, medo de ficar calado, medo de falar, de olhar, de apontar para uma rua, de pedir ou dar informação, de usar os trens, barcas, metrô ou ônibus. Medo também de andar de bicicleta ou patins ou taxi ou carro.
Até estou ficando com medo de assistir TV com seus noticiários macabros e recheados de notícias tenebrosas de acidentes, terremoto, maremoto, tsunami, vendaval, furacão, tornado, enchente, erupção, assassinato, bala perdida, violência, injustiças da justiça e sobre corrupção.
Tenho medo de pensar que presidente, senador, deputado federal estadual ou vereador, juiz, promotor, defensor, governador, prefeito, secretários federais, municipais ou estaduais, policiais, advogados, militares, dentistas, médicos, engenheiros possam ser corrompidos.
Medo de pensar nos meus filhos e nos meus pais neste mar de lama tendo que fazer parte do sistema para conviver com ele.
Medo do dono dos morros e dos morros sem donos, medo das grades invadidas ou de estar fora delas, medo de ficar na janela ou tomar banho de mar.
Medo de tocar meu violão na esquina, de passear com a menina que pode ser também rapaz, medo de ser rotulado de afro, skinhead, homossexual, nazista, terrorista, traficante ou coisa e tal.
Medo de ter carro novo e virar alvo, de ter carro velho e não poder escapar, de ter moto e levar tiro, de passar em Blitz e de não ver Blitz onde passo.
Estou com medo de ser moderno, contemporâneo, revoltado, revolucionário, retrógrado ou mesmo líder ou liderado, medo de ter ideal.
Medo de sair com os documentos e cartões e medo de estar sem eles diante de policiais ou ladrões.
Estou diante de um estranho paradoxo: diante de tanto medo por estar vivo meu maior medo passou a ser o de morrer, dá para entender?
Sei que não posso falar de problemas sem apontar soluções: precisamos da humanização dos homens, do cumprimento de suas palavras, de ética, moral, bons costumes.
Precisamos de respeito mútuo e oportunidades iguais para todos e o fim de uns serem mais iguais que os outros. Precisamos de uma elite participativa, patriótica e responsável. Precisamos de formadores de opiniões comprometidos com a evolução da sociedade e não de seus patrimônios. Precisamos do fim das imensas desigualdades sociais onde uns moram numa casa que cabe na metade da sala do outro.
Precisamos que as empresas permitam que seus empregados evoluam em patrimônio proporcionalmente ao enriquecimento que proporcionam aos investidores capitalistas. Precisamos que os mais abastados se privem de fazer caridades patriarcais e invistam no desenvolvimento intelectual dos que os cercam direta e indiretamente.
Precisamos de competência dos governantes e governados, de votos localizados, de prestação de contas de tudo que é público com transparência.
Precisamos inverter o sistema punitivo passando a punir exemplarmente os que são célebres e com complacência os que são socialmente desajustados, pois eles carregam uma culpa a qual não deram causa e que deu origem a muitas das fortunas dos que comandam as leis ou aos legisladores.
E, para finalizar, agora estou ainda com mais medo... Eu não deveria me manifestar!


Borges.RJ
Contador de Histórias
borges.rj@globo.com