Meu
irmão casara com uma paulista erradicada no Rio de Janeiro. Não teve papéis nem
cerimônias, mas moravam juntos e por isso estavam casados.
Foi
um susto ver minha cunhada abraçada e sorridente entrando num restaurante perto
do aeroporto com outro homem. Fiquei num impasse: meu irmão deveria ou não ser
informado daquele encontro alegre e furtivo?
Se
em mim doía ver aquele casal tão feliz junto. Doía ainda saber que a felicidade
deles seria o desespero e uma dor maior que a minha para meu apaixonado irmão.
A
família ficaria estarrecida... Conto? Não conto? Passei a tarde assim aflito!
A
aflição aumentou ainda mais quando minha cunhada convidou a família para jantar
na casa do casal. Como encará-la e calar? Como encarar meu irmão e não contar?
Ela
era a infiel e eu estava entre a covardia e sei lá que sentimento.
Se
eu contasse...
Se
eu não contasse...
O
que fazer? Achei melhor não ir ao jantar.
O
expediente acabou e indócil lá fui eu a um barzinho num conflito interno
inimaginável naquela manhã. Como eu estava feliz naquela manhã! Era sexta-feira
e o fim de semana prometia ser divertido. Iríamos passear em família em
Itacuruçá, passear de saveiro, comer peixe fresco com camarão, tantos planos e
aquela ingrata se deixou pegar com seu amante. E eu era testemunha de sua
intensa felicidade...
Resolvi
ir ao jantar!
Cheguei
taciturno, fiquei calado em meu canto, um olhar de ódio que eu desviava de
minha cunhada para que ela não percebesse minhas decepções e meu conflito
injurioso.
Todos
já haviam chegado e ela alongava aquele encontro sem servir o jantar...
A
campainha toca e ela entrega uma champanhe na mão de meu irmão e corre para
abrir a porta e para minha surpresa, ali, diante de todos, se joga nos braços
de seu amante!
Hein!
Que mundo é esse! Ela teve a desfaçatez de trazer o amante para um jantar de
família e ninguém sequer demonstrou espanto?
Em
meio aquele mal-estar inexplicável com palavras já estou de pé e sinto meu
corpo cair na poltrona quando com dificuldade decifro as palavras de minha
cunhada:
-
Este é meu irmão, chegou hoje do exterior, almoçamos juntos e acomodei ele num
hotel por insistência dele mas não podia deixa-lo fugir de uma apresentação
formal a minha nova família.
Meu
irmão estava abrindo o champanhe e olhava estupefato para mim que chorava como
criança.
Desta
vez chorei um novo choro: não era alegria, felicidade, desespero, dor ou
saudade – era só um tremendo alívio acompanhado pela culpa de um ditador pelo
meu julgamento sumário e precoce, e sem direito à defesa!
Só
não consegui sentir-me pior do que os agentes da lenta e elitizada justiça!
Borges.RJ
Contador de Histórias
borges.rj@globo.com